19 abril 2018

O Brasil tem saída, diz investidor do unicórnio 99

Para Carlos Kokron, chefe da Qualcomm Ventures na América Latina, a venda bilionária de uma startup brasileira mostra que há inovação lucrativa fora do Vale do Silício

O ano começou em clima de vitória na Qualcomm Ventures. O braço de corporate venture da Qualcomm apostou desde cedo na 99, que em janeiro anunciou sua venda à chinesa Didi Chuxing. O aplicativo de transporte tornou-se, assim, o primeiro unicórnio brasileiro — ou seja, uma startup avaliada em mais de US$ 1 bilhão. Mas mais do que encher o bolso dos investidores, a aquisição teve outro papel: mostrar que inovações lucrativas não são exclusividade do Vale do Silício. É o que defende Carlos Kokron, vice-presidente e diretor executivo da divisão da Qualcomm Ventures para a América Latina. Aqui, Kokron comenta as características que uma startup precisa para chamar a atenção de fundos de investimento e discute a maturidade do ecossistema de empreendedorismo brasileiro.

O que a Qualcomm Ventures analisa nas startups antes de investir?
Queremos saber se os empreendedores estão criando um bom negócio. Fazemos as mesmas perguntas que todo bom investidor faria.

  • A empresa pode crescer bastante? 
  • Terá uma margem boa? 
  • Está em um mercado grande? 
  • Tem uma equipe diferenciada? 
  • Se as respostas forem "sim", vem a próxima pergunta: é um bom deal, uma boa transação? 
  • O valor da ação vale a pena o risco? 
  • Além dessas questões, a Qualcomm tem outra: se o negócio der certo, estará alinhado com os nossos objetivos estratégicos de acelerar a criação ou adoção de novas tecnologias? 

Nosso objetivo é investir em empresas relacionadas com o nosso ecossistema. Globalmente, por exemplo, olhamos muito para como o 5G — que vai ser a próxima grande transformação na indústria.

Por que era importante para a Qualcomm ter esse braço de investimento?
A gente investe por várias razões. Primeiro, investimos para obter resultados financeiros. Portanto, é importante ter um crivo alto, para apoiar empresas que irão crescer e se tornar independentes. Mas isso é só a base. Do ponto de vista estratégico, a gente investe para acelerar a criação de novas tecnologias e para aprender sobre novas tendências. Nós dividimos com os executivos da empresa o que estamos vendo.

A Qualcomm Ventures investia na 99 desde 2013. O que a venda da empresa significou para vocês?
Foi excelente, a gente está superfeliz. Valida a importância de termos uma plataforma global. A 99 conseguiu demonstrar que você pode criar valor significativo em mercados além do Vale do Silício. Você tem pessoas criando soluções e novos negócios globalmente. Mostra que vale a pena investir no Brasil. Tivemos logo em seguida também a venda da Strider [startup brasileira que desenvolve inovações tecnológicas para o mercado agrícola], que foi mais uma validação enorme. As tecnologias móveis do mundo conectado são uma realidade global, não monopólio do Vale do Silício.

É um sinal de maturidade do ecossistema brasileiro?
A venda da 99 foi um divisor de águas. Se você olhar o ecossistema de empreendedorismo digital no Brasil, a evolução ao longo dos últimos dez anos foi fantástica. Eu atuo no mercado desde 1999. Percebi que a coisa começou a tomar uma forma diferente uns dez anos atrás. E está acelerando. No começo, diziam que o país tinha empreendedor, mas não havia dinheiro. Depois tinha dinheiro, mas não havia saída. Acho que agora conseguimos mostrar que existe saída, sim. O Brasil passou por anos muito difíceis. Felizmente, vemos que a percepção está mudando. Você tem várias empresas levantando um capital substancial ultimamente. Quando você cria valor com algo diferenciado, mais cedo ou mais tarde vai chamar a atenção de compradores. Vemos uma evolução enorme. A roda finalmente girou.

Alguma característica diferencia os empreendedores da América Latina dos do Vale?
Acho que sim. De certa forma, empreender no Brasil é mais difícil. Você tem um sistema mais inóspito. Há complicações de tributação, falta de certeza no sistema jurídico. Isso requer empreendedores com tenacidade maior. Em segundo lugar, a gente tem ainda uma quantidade de capital bem menor. Isso significa que geralmente vemos menos competidores. Então existem prós e contras.

Se eu quero empreender, em quais setores deveria ficar de olho no Brasil?
Temos uma onda enorme de fintechs no país. Como nossa indústria financeira é muito acomodada, um grande número de clientes são atraídos por soluções tecnológicas melhores e mais baratas. Também acredito muito em internet das coisas para resolver problemas em várias indústrias, na agricultura e em cidades inteligentes.

Do que uma startup precisa para se apresentar a um investidor?
Tem de responder bem a pergunta: se eu der certo, como posso ajudar vocês a criar novas soluções móveis? Gostamos de empreendedores com uma história bem articulada. Tem que conhecer o problema a ser resolvido e as alternativas que existem. Tem que articular o diferencial e o modelo de negócios. Isso ajuda a conversa a fluir. Ainda vemos empreendedores despreparados. POR EDSON CALDAS . Leia mais em epocanegocios 18/04/2018

19 abril 2018



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